Será essa, a pedra de Antoine Roquentin?


I

Seria mais sensato ficar deitado, muito quieto (o mais quieto possível), descansar um pouco mais no fiapo escuro que resta desta madrugada; nada fazer, nada pensar, nada esperar… até porque pouco me separa do nada; estou longe, muito longe da noção que me tento reter de “tempo”: não separa nem significa nada. - Estou mais perto, muito mais perto do absurdo que é o absoluto, da finitude, da unicidade que pode conter (por exemplo) uma pedra.
Uma pedra (“dum lado (…) inteiramente seca, húmida e enlodada do outro”) tal como a que irei encontrar daqui a pouco, quando descer ao pequeno areinho de L., à pequena orla de pedras e um pouco de areia suja que os locais teimam chamar “a praia”. - Seria mais sensato não ir… mas teima a pedra que procuro há muito; tenho a certeza que será desta vez que tocarei na pedra que Antoine Roquentin deixou cair, antes de a tentar lançar ao mar “para as fazer saltar de ricochete”, como os garotos faziam, nesse sábado distante do mundo. Tenho a certeza…

Tenho a certeza “da pedra”, dessa pedra, do seixo, do agregado sólido e melancólico (foi nesse sábado que Sartre sonhou com Melancholia) que se transformou numa “espécie de náusea nas mãos”; encontrarei algures nesta “praia” esse pequeno seixo que não se deixa tragar pelo (nosso precário conceito de) tempo; “a pedra” ocorreu (algures) sedimento, textura, paciente forma em decomposição… e mais tarde, (também algures, talvez aqui em L.), confundiu-se com o mar, segundo Antoine Roquentin. - Com o mar, nunca com o tempo: - O tempo não se move, não se entrega, não planeja; o tempo não significa nada,

e pouco me separa do nada ou da finita sensação de absoluto…
e como é absurdo o absoluto; seja!


II

Ei-la, a estranha palavra “pedra”! – Será essa a pedra de Antoine Roquentin?

......
Abril, 4 – 2018 (rascunho/original, não revisto)
t. ketil

[enquanto escrevo escuto “And In The Endless Pause There Came The Sound Of Bees”, Jóhann Jóhannsson]


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